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Rebreather RB-80

Por Marcus Werneck


Rebreather RB 80 - O segredo está na simplicidade

 

 

Faz uns cinco anos que estou interessado em rebreather. Sempre achei que esta seria a ferramenta do futuro. Meu interesse – além da natural curiosidade em descobrir novas tecnologias – visava comprovar as vantagens logísticas que esse equipamento poderia proporcionar, principalmente em expedições e explorações em lugares remotos.
A idéia de aumentar a autonomia dos mergulhos e a economia de gás, além de melhorar a logística do abastecimento, me empolgava muito. Nestas situações, mesmo para poucos mergulhos, às vezes, é preciso transportar muito gás (oxigênio e hélio), além dos compressores. Apesar disso, as unidades disponíveis até então me pareciam muito complicadas, com configurações limitadas ou baseadas em uso de componentes eletrônicos, fatores que, confesso, me desanimavam bastante. Até o primeiro rebreather da Halcyon, que foi testado pelo WoodvilleKarstPlainProject (WKPP) em suas explorações, me decepcionou um pouco – apesar de gostar muito do conceito da adição passiva – pelas dimensões da unidade, ainda demasiadamente grande e em alguns pontos mal-acabada.

Tinha quase esquecido desta idéia quando me deparei pela primeira vez com o RB 80. Não precisava ser um especialista para sentir que alguém tinha desatado o nó. Simples, compacto, permitindo várias configurações.

Não demorei muito para convencer outros mergulhadores entusiastas (Luiz Toledo, Maurício Henriques e Patrick Muller) a partir comigo para a Flórida (EUA), onde tivemos 7 dias de curso com Jarrod Jablonski, presidente da Halcyon e do GlobalUnderwaterExplorer (GUE) e Andrew Georgitsis, diretor de treinamento do GUE, sobre o funcionamento e uso do RB 80.

Apesar do funcionamento do RB 80 ser muito próximo ao do circuito aberto, e a configuração DIR ser familiar a todos nós, o período de curso e de água foi importante para a nossa adaptação em mergulhar sem soltar ar pelo nariz e controlar o equilíbrio só com o colete.

As possibilidades oferecidas pelo RB 80 me fazem sentir como nos meus primeiros anos de mergulho. Espero conseguir realizar só a metade dos mergulhos que estou planejando

O que é um rebreather (reciclador de gás)?

É um equipamento que recicla parcial ou totalmente o gás exalado por um mergulhador, aproveitando esse mesmo gás nas próximas inspirações.A tecnologia do  Rebreather não é nova, em 1680 Giovanni Borelli já sonhava com um equipamento de circuito fechado. Em 1726 foram usados como equipamento de emergência para trabalhadores de minas, e na segunda guerra foram usados em operações militares anfíbias.
Rebreathers são equipamentos mais complexos que o circuito aberto (SCUBA), é até pouco tempo não eram considerados seguros para serem usados por mergulhadores recreativos.

Funcionamento dos Rebreathers

Todos os rebreathers modernos possuem algumas características básicas para o seu funcionamento. Vejamos:

1. Um contra-pulmão: reservatório onde fica armazenado o gás que será reciclado;
2. Scrubber: reservatório que contém a cal sodada ou soda sórbica, produto químico responsável por retirar o CO 2 da mistura. A expiração do mergulhador contém CO 2 e vapor d’água, que combinados, formam ácido carbônico, sendo este neutralizado quando exposto à cal sodada, uma substância alcalina, gerando, através desta reação, calor e umidade;
3. Mecanismo de adição de gás (varia conforme o tipo de equipamento);
4. Um bocal que conecta as mangueiras de inalação e exalação.

Vantagens

Desvantagens

1. Maior suprimento de gás utilizando o mesmo cilindro ou menores.
2. Maior tempo de fundo;
3. Maior hidratação (o gás é umidificado).
4. Gás mais aquecido (o gás é aquecido pelo processo).
5. Menos bolhas e barulho; maior interação com a vida marinha.
6. Maior eficiência descompressiva.
7. Menor necessidade de logística para a recarga.
8. Menor gasto com gases para misturas 

1. Complicações operacionais adicionais;
2. Risco de hipoxia ou hiperoxia;
3. Risco de hipercapnia;
4. Mudança do padrão respiratório;
5. Menor controle de flutuabilidade com o pulmão;
6. Possibilidade de alagar a unidade e formar um coquetel sódico que pode queimar as vias aéreas do mergulhador.

 

Enchendo o scrubber com cal sodada

O scrubber completo com a cal sodada

Tipos de rebreathers

Basicamente existem dois tipos: os de circuito fechado – que reciclam todo o gás exalado; e os semifechados – que reciclam parte do gás exalado, eliminando a outra parte para o ambiente (bolhas).

Circuito fechado

Os rebreathers de circuito fechado geralmente possuem dois pequenos cilindros: um contendo oxigênio puro e o segundo com algum outro gás que será usado como diluente, ou seja, a mistura respiratória final é produzida durante o mergulho. Sendo assim, esse equipamento utiliza alguns sensores de oxigênio em determinados pontos do sistema para medir a fração desse gás na mistura, e computadores para controlar a injeção de gás durante o mergulho que é feita com base nos dados de pressão parcial de oxigênio escolhida para ser usada e a análise média da leitura dos sensores.

Sem dúvida esse equipamento é muito mais eficiente do que o de circuito aberto (scuba), pois o consumo de gás pode ser 20 vezes menor e como a ppO 2 é constante durante o mergulho, as obrigações descompressivas são menores e os tempos de fundo não descompressivos bem maiores.

Apesar dessas vantagens, esse tipo de equipamento não se tornou popular. Como o seu funcionamento está baseado em sensores eletrônicos e computadores, esses componentes aumentam a chance de falhas – que podem causar hipoxia ou hiperoxia durante o mergulho, além de aumentar a dificuldade operacional, a manutenção e o preço da unidade.

Oxigênio puro

Esse tipo de equipamento começou a ser usado intensivamente durante a Segunda Guerra Mundial para operações militares anfíbias. Era composto basicamente por um cilindro de oxigênio puro, o que limitava sua profundidade máxima de operação, além de existir o risco de hiperoxia (intoxicação por oxigênio), principalmente por causa dos protocolos militares que eram usados durante a guerra

Semifechado com adição ativa

A diferença básica entre os fechados e os semifechados é que este último, além de não reciclar todo o gás exalado, não produz a mistura durante o mergulho. Os semifechados utilizam suprimento de gás pré-misturado, tal como o circuito aberto. Rebreathers de adição ativa adicionam gás continuamente durante o mergulho.

Como há uma diferença entre a fração de oxigênio na mistura (gás injetado) e a fração de oxigênio inspirado, existe a necessidade de se determinar previamente o fluxo correto a ser usado no mergulho. O mergulhador deve escolher o ajuste a ser utilizado, através de uma fórmula matemática, com base na utilização metabólica de oxigênio prevista para o mergulho (VO 2), e a fração de oxigênio na mistura respiratória utilizada (nitrox). 

Esse tipo de equipamento, fabricado pela Drägger, vem sendo usado há alguns anos por mergulhadores recreativos. Mas apesar de ter um preço acessível, não obteve sucesso, pois dependendo da escolha do fluxo, a unidade produz muitas bolhas e sua autonomia não é maior do que a conseguida por um mergulhador que utilize cilindro duplo – sua configuração só pode usar um cilindro de 6 litros de volume hidrostático para o gás de fundo e um outro pequeno cilindro como emergência em circuito aberto.

A adição ativa oferece risco de hipoxia já que pode haver falha do mecanismo de adição e bloqueio parcial dos orifícios, sem que o mergulhador seja previamente avisado

Semifechado com adição passiva (RB 80)

Um rebreather é considerado de adição passiva quando a adição de gás depende da respiração do mergulhador, ou seja, a adição passiva só adiciona gás quando o mergulhador respira. Por esse motivo, as chances de hipoxia são menores, pois qualquer problema com o mecanismo de adição de gás, gera alteração na resistência respiratória. Esse sistema de alarme fisiológico, além de ser bastante efetivo, não requer nenhuma interface ou equipamento especial. A operação e a preparação deste equipamento é muito parecida com a do circuito aberto, já que não existe a necessidade de cálculos ou calibragens pré-mergulho, o que facilita a familiarização mais rápida e efetiva com o equipamento. O consumo de gás pode ser reduzido entre 4 e 8 vezes – esse valor pode variar de acordo com o perfil do mergulho, a utilização do colete, desalagamento da máscara, expiração pelo nariz e outros maus hábitos que adquirimos com o circuito aberto.

O mouthpiece do RB 80 


O "pulmão" do RB 80

RB 80

Este é o único rebreather que utiliza o sistema de adição passiva. Foi desenhado e desenvolvido pelo dr. Reinhard Buchaly e pelos mergulhadores do WoodvilleKarstPlainProject ( WKPP) e do GlobalUnderwaterExplorer ( GUE), sendo esta a única certificadora que ministra treinamento para o RB 80 e sem o qual a unidade não é vendida. Este equipamento foi testado em todos os tipos de mergulho e ambiente, inclusive em mergulhos em cavernas com penetrações de 6 quilômetros com duração de 18 horas. É fabricado com exclusividade pela Halcyon com algumas evoluções importantes em relação ao modelo anterior da empresa. Vejamos quais são:

1. Tamanho: menor que um cilindro de alumínio S 80;
2. Versatilidade de configuração e montagem: aceita quase todos os tipos de cilindro e pode ser montado e desmontado em qualquer lugar em menos de 15 minutos;
3. Manutenção mínima: por não possuir nenhum componente eletrônico, a manutenção é igual a de um segundo estágio de regulador;
4. Scrubber: capacidade para 3,8 quilos de cal sodada, o que dá uma média de 10 horas de autonomia de mergulho sem a necessidade de troca do produto químico;
5. Performance: capacidade para diminuir o consumo de gás em até 8 vezes, ou seja, com a configuração de dois cilindros de alumínio S 40 você terá gás equivalente a oito cilindros S 80 em circuito aberto;
6. Utilização de misturas: capacidade para utilizar todos os tipos de misturas respiratórias e trocar misturas de descompressão durante o mergulho;
7. Remoção de água: coleta e remove automaticamente, por gravidade, a água do sistema, diminuindo quase a zero o risco de alagar a unidade e formar coquetel sódico;
8. Check de realidade: o bocal do RB 80 tem um sistema integrado de circuito aberto, que pode ser acionado rapidamente com um toque caso haja alguma falha na unidade ou o mergulhador queira, por algum motivo, passar para o circuito aberto, sem que seja necessário retirar o bocal.

Depoimentos

Mergulhando com o RB 80
Por José augusto Dias

Faz algum tempo que leio artigos sobre rebreathers. O assunto e o equipamento são bem interessantes e chama a atenção de todo mergulhador.

Em janeiro de 2000 estive na Flórida (EUA) mergulhando nas cavernas e aproveitei para observar de perto o antigo rebreather da Halcyon, e embora ele fosse um dos melhores do mercado, achei, na minha opinião, que ainda faltava um bom caminho a percorrer até que eu acreditasse que os rebreathers seriam uma possibilidade real no mergulho recreacional

Naquela época todos os modelos ou eram problemáticos de usar ou precisavam de vários checks pré-mergulho, além, é claro, da parte eletrônica. Ainda faltava alguma coisa, faltava simplicidade. Não cheguei a mergulhar com a unidade, mas ela agradava pelo fato de não usar nada eletrônico e nenhum outro artifício de controle de ppO 2, fluxo, etc.

Em maio de 2002, Marcus Werneck, Maurício Henriques, Patrick Muller e Luis Toledo partiram para a Flórida com o objetivo de fazer o treinamento no novo modelo de rebreather da Halcyon, o RB 80. Já havia lido algo sobre este modelo, mas ler e simplesmente aceitar o que estava escrito não me satisfez. Parecia que a simplicidade finalmente havia chegado com o novo modelo. Mas seria aquilo mesmo que estava escrito?

Nada melhor do que o bom e velho teste de São Tomé, só vendo para crer.
Depois de ter feito alguns mergulhos acompanhando o Marcus Werneck – ele de rebreather e eu com o equipamento tradicional –, recebi o convite para testar o RB 80. Chegou a hora de matar a minha curiosidade e conferir (apesar de estar praticamente convencido) da simplicidade desta unidade.


Saímos na lancha Sea Life da Sottomare com destino à Ilha Rasa, no litoral do Rio de Janeiro. Eu com uma dupla PST 104 carregada a 3.000 PSI e o Werneck com o RB 80 montado com uma "duplinha" de S 40 com pouco mais de 2.000 PSI.

No primeiro mergulho somente observei e o auxiliei no "ganhar horas d'água" com o rebreather. Depois de 60 minutos, aos 20 metros, ele havia consumido algo em torno de 400 PSI, uma enorme diferença em relação ao equipamento tradicional.

Após o intervalo de superfície trocamos de equipamento e eu finalmente pude usar o RB 80.
Como usamos a configuração DIR, não houve nenhuma dificuldade na troca.
No início do mergulho – até os 3 metros – estava respirando no circuito aberto do rebreather (ao contrário de outros modelos, o RB 80 oferece esta garantia caso haja falha na unidade). Eu disse falha? Sim, falha. Até esse momento o único ponto negativo que observei no RB 80 foi a grande quantidade de pontos de falhas: existem conexões e onde há conexões existem o'rings...

Quando acionei o circuito fechado, tive a surpresa (embora aguardada) de sentir a diferença que é respirar em um rebreather. Lembram daquela brincadeira de criança de respirar em um saco plástico? Respirar no RB 80 é bem parecido. O esforço respiratório é completamente diferente do circuito aberto, não existe pressão empurrando o ar para a sua boca – você literalmente empurra e puxa o ar – e a respiração passa a ser mais curta, muito próximo do que fazemos em condições normais todos os dias. O controle da flutuabilidade agora é feito apenas com o colete e a roupa seca; o pulmão perdeu sua função no auxílio da flutuabilidade.

Não leva mais do que 5 minutos para o primeiro impacto passar e a "viagem" começar.
Silêncio! Quem achou que conhecia o silêncio do fundo do mar estava enganado. Nenhum barulho, nenhuma bolha, nada vibra. Posso jurar que quando o Werneck estava próximo podia ouvir os meus MK 20 funcionando e as bolhas que o meu equipamento soltava (lembre-se que ele estava usando o "meu" equipamento). Não é à toa que os fotógrafos e cinegrafistas estão migrando para os rebreathers. Pode-se chegar tão perto da vida marinha que é possível tocá-la.

O trim do RB 80 é perfeito. Ele encaixa tão bem nas costas que os outros cilindros parecem extremamente desconfortáveis. Um equipamento leve se comparado com uma dupla (o RB 80 pesa menos do que uma dupla de AL 80). Aqui cabe uma explicação: o 80 refere-se à semelhança com os cilindros AL 80 e o RB são as iniciais do nome do seu criador, o Dr. Reinhard Buchaly.


Quem foi aluno do Marcus Werneck como eu não poderia esperar outra coisa senão um "ataque". Sem que eu me desse conta, a primeira simulação de pane foi no fornecimento de ar. De repente percebi que o fornecimento estava sendo reduzido e eu ficaria sem ar no rebreathers, o que poderia ser um desespero, uma vez que eu não tinha treinamento. Mas bastou um simples movimento na "chave" que existe no mouthpiece e eu já estava respirando no velho circuito aberto. Uma segunda pane veio com a parada do contra-pulmão que foi facilmente corrigida com o mesmo movimento. O mais impressionante é que nenhuma dessas panes foi combinada, tudo foi instintivo. Os alertas são naturais e o fornecimento de ar vai sendo reduzido em pequenas doses até acabar. Isso dá tempo suficiente para trocar para o circuito aberto do rebreather ou até mesmo passar a não usá-lo, pois o RB 80 permite usar o sistema convencional como bailout (reserva).

Após 30 minutos de fundo retornei à superfície com a certeza de que o RB 80 veio para ficar. A simplicidade do sistema é impressionante e de fácil manuseio. Posso afirmar que, muito em breve, este equipamento se tornará popular – só falta o preço ser mais acessível – mas isso deve levar pelo menos uns 2 ou 3 anos. O jeito é ficar relembrando a experiência.

TEST-DIVE
Por Ary Amarante

Usar um rebreather era uma curiosidade antiga. Há muito tempo que leio sobre o assunto, ouço comentários, mas não havia tido a oportunidade de usar esse equipamento. Para quem não conhece, um rebreather é um equipamento que elimina o gás carbônico produzido durante o ciclo respiratório. O ar exalado, ao invés de ser liberado na água como nos equipamentos autônomos convencionais ditos de circuito aberto, é conduzido a um recipiente com cal sodada ou soda sórbica, que elimina o CO 2, produzindo calor e umidade. Esse tipo de equipamento é chamado de circuito semifechado. Existe uma liberação ocasional de ar para fora do sistema, em torno de 10% da respiração, para manter o nível adequado (pressão parcial) de O 2, que não é produzido pelo processo químico que ocorre no rebreather. A grande vantagem no uso deste equipamento é um aumento expressivo da autonomia do mergulhador, que se torna mais significativa com o aumento da profundidade, já que o desperdício de gás nos equipamentos de circuito aberto aumenta de forma diretamente proporcional.

Para mim, o grande interesse era testar um singular efeito colateral: quanto menos bolhas e barulho, mais fácil é aproximar-se dos peixes, ou seja, melhores imagens de foto e vídeo da fauna marinha. O convite feito por Marcus Werneck para testar o rebreather Halcyon RB 80 – que ele adquiriu recentemente nos Estados Unidos – foi prontamente aceito, ainda mais sendo um mergulho no Rio de Janeiro, onde moro. Saímos da Marina da Glória na lancha Sea Life da Sottomare, com tempo bom, mar bem calmo, prenúncio de bons mergulhos.


A visão inicial do equipamento impressionou um pouco pela diferença visual em relação ao equipamento de circuito aberto. O rebreather Halcyon é composto de um cilindro de PVC e delrin com suporte para dois cilindros, um de cada lado. Os cilindros laterais têm reguladores convencionais que alimentam o circuito fechado através de mangueiras de baixa pressão, além da opção de uso em circuito aberto, ou seja, como um cilindro scuba normal. O segundo estágio tem mangueiras de traquéia, como nos antigos reguladores dos filmes do Mike Nelson. O ar vem por uma mangueira e retorna ao sistema pela outra para ser reciclado.

O ponto escolhido para os dois mergulhos do dia foi o naufrágio do vapor Buenos Aires, na Ilha Rasa. No primeiro mergulho desci com equipamento convencional, fotografando o Marcus Werneck em ação com o rebreather. Foi bem interessante vê-lo se aproximar de peixes praticamente sem soltar bolhas e as poucas que ocasionalmente saíam eram liberadas nas costas, por orifícios de exaustão próximos à cintura. Nesse instante, comecei a pensar em como um equipamento destes poderia me ajudar na fotografia de seres marinhos tímidos ou arredios. Durante o mergulho, uma surpresa desagradável: uma arraia-jamanta com um arpão no dorso, arrastando alguns metros de cabo de nylon, certamente cortado pelo caçador quando viu que seria arrastado pela sua presa. O Werneck conseguiu se aproximar mais dela do que eu, e pareceu a ele que o arpão estava cravado em uma grande rêmora presa na arraia, e não diretamente sobre ela. De qualquer modo, fica a dúvida sobre o que o pretenso caçador submarino estava pensando ao arpoar uma jamanta: será pelo tamanho do troféu? Certamente pela esportividade ou pela carne não deveria ser. Infelizmente não foi possível libertar a arraia de seu fardo. Após uns 40 minutos de mergulho o manômetro mostrava que o meu cilindro de 80 pés cúbicos estava quase vazio – restavam pouco menos de 50 bar –, e era hora de começar a subir. O Werneck me mostrou seu consumo, algo em torno de 20 bar para dois cilindros de 40 pés cúbicos cada. Cento e cinqüenta bar meus contra 20 bar dele era realmente uma diferença pra lá de significativa. Teoricamente ele poderia ficar pelo menos 7 a 8 vezes o meu tempo de fundo com o mesmo volume de ar (obviamente ressalvando-se os cuidados com doença descompressiva).

No barco, uma rápida aula sobre como utilizar o equipamento e o que fazer em casos de emergência, e lá estava eu me equipando para a descida com o rebreather, montado em configuração DIR, com asa e backplate de aço inox. Uma alavanca no segundo estágio garantiria uma rápida troca do circuito aberto para o fechado, e vice-versa, em caso de problemas. Um segundo estágio convencional estava à disposição para emergências. A coisa parecia tranqüila. Lá fui eu, desta vez de câmera de vídeo, para captar imagens em macro para a segunda e incrementada versão do meu CD-ROM de Identificação de Seres Marinhos, já em fase de preparo. Minha idéia era a de aproveitar a ausência de bolhas e barulho de expiração para me aproximar mais dos peixes, e conseguir, assim, melhores imagens.

O equipamento, diferentemente do que eu estou acostumado, me incomodou um pouco no início. Seguindo as recomendações do Marcus Werneck, desci os primeiros metros usando circuito aberto (no raso, usando-se o circuito semifechado, a pressão parcial de O 2 pode ficar muito baixa, se a respiração for muito leve), e só aos 4/5 metros mudei para circuito fechado. A primeira impressão foi a de que o ar estava acabando, já que o esforço inspiratório aumentou um pouco. Foram alguns minutos de desconforto até me acostumar com essa situação. Outra diferença é que o ar fica mais quente, e muito mais úmido do que o ar respirado em circuito aberto. Outro problema não enfrentado com equipamento autônomo convencional foi que, cada vez que eu saía da posição horizontal e ficava com a cabeça mais alta do que o tronco, era como se o ar fosse empurrado pela minha boca (pequenas diferenças de pressão entre o segundo estágio e o "pulmão" do rebreather, que fica nas costas, na altura dos rins, já são suficientes para esse efeito). O jeito era ficar quieto na horizontal. E ainda havia um outro fator complicador: eu estou acostumado a usar o ar nos pulmões para uma "sintonia fina" no equilíbrio, principalmente quando a aproximação é delicada e deve ser feita com o mínimo de movimento possível. No caso do rebreather isso não funciona, pois quando eu esvaziava os pulmões, o "pulmão" do rebreather enchia, e vice-versa. Gastei uma boa quantidade de ar "apanhando", até conseguir me sentir à vontade. Foram 40 minutos de experiência que deixaram um gostinho de "quero mais"; havia pouca vida para que eu pudesse afirmar que foi mais vantajoso mergulhar com o rebreather para fazer imagens. Mas mesmo assim consegui fazer imagens macro de budiões e marias-da-toca, que se aproximaram curiosas quando eu conseguia ficar quieto no fundo. De qualquer forma, como todo equipamento, o uso de um rebreather requer treino para uma correta utilização. Mas valeu a experiência, e ficaram as fotos que o Marcus Werneck fez de mim como lembrança.

O rebreather RB 80 da Halcyon é um equipamento que não é fabricado em larga escala, por isso tem custo elevado. Mas existem muitas vantagens sobre os rebreathers tradicionais encontrados no mercado, sendo a principal delas o risco muito menor de formação de coquetel sódico – nome dado à mistura de água e cal sodada que acontece com alguns rebreathers quando, inadvertidamente, o mergulhador deixa entrar água no sistema. Esse coquetel é extremamente indigesto, arde as mucosas, incomoda, e pode causar problemas sérios com a continuidade de contato. Além disso, a adição de gás "fresco" à mistura respirada pelo mergulhador é passiva, ou seja, o gás só vem sob demanda, não há fluxo constante de ar, como acontece no rebreather Dolphin da Drägger (que exige que o mergulhador saiba qual a sua taxa de respiração para planejar uma vazão adequada). A adição passiva de gás evita seu desperdício e o risco de hipoxia (falta de oxigênio por vazão mal calculada ou esforço imprevisto).

O RB 80 tem grande versatilidade (aceita várias configurações) para mergulhos em quaisquer profundidades e durações. Pode-se usar cilindros de gás pequenos e leves para mergulhos mais rasos ou mais curtos, e cilindros de grande capacidade para mergulhos longos, como penetrações em cavernas.

Tomara que esse equipamento "pegue", seja produzido em quantidade e, com a economia de escala, se torne mais barato. Aí quem sabe eu entre nessa festa...